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segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Politica e Fé não se misturam - Carolina Regis di Lucia e Reinaldo di Lucia


Politica e Fé não se misturam

Há duas décadas, também em período eleitoral, um grande companheiro de Espiritismo lançava-se no cenário politico local. Eu estava na Mocidade e acompanhava o apoio de todos à sua empreitada, certos de que era uma opção acertada e ética a votar. Até que comecei a ver santinhos do candidato no mural do centro e uma discussão sobre trazê-lo para falar aos jovens em uma de nossas reuniões... Aquilo me pareceu estranho, de certo modo até errado, mas, com a maturidade em formação na época, não sabia elaborar perfeitamente o que sentia. Lembro que havia recém convidado duas amigas não espiritas para frequentar o grupo e receava o que elas iriam pensar, vendo uma casa para estudo da Doutrina, estar claramente apoiando, divulgando e incentivando o voto em um candidato interno. Quando da votação sobre trazê-lo ou não para o grupo, fui a única contrária, expondo que não achava correto propaganda politica dentro do centro, de quem quer que fosse. Algumas pessoas ficaram chocadas com meu posicionamento, afinal, era diretor da casa, de moral inquestionável, que faria a diferença na política da região. Outros não entendiam o porquê da casa não poder apoiar um candidato conhecido. Porém, apesar de ser minoria, meus questionamentos foram incômodos o suficiente para que os santinhos saíssem dos murais e o evento não acontecesse. Em tempo, o candidato não alcançou os votos necessários e jurou que nunca mais se meteria com política – desgostoso do que encontrou nos bastidores eleitorais.

Vinte anos após esse episódio, já tenho alguma bagagem a mais para poder afirmar que política e fé não devem se misturar oficialmente. Haja vista o caos social desta eleição: nas redes sociais, mesas de bar, nos almoços e encontros de trabalho e nas manifestações populares são observadas toda a imaturidade do brasileiro em, não apenas discutir política – assunto que absolutamente não dominamos - , mas no direito básico e intrínseco do outro em pensar diferente. Parentes, amigos antigos, colegas e completos desconhecidos, com a tradicional paixão latino americana, se agridem, se humilham, cortam relações pelo simples fato de não aceitarem a escolha eleitoral do outro.
Aceitemos: o brasileiro ainda é analfabeto politico. Sequer entende o próprio sistema de governo, escolhe o candidato por frases e ideias soltas, como se fossem personagens de vídeo game com poderes ilimitados para salvar um país afundado por anos e anos de.... analfabestimo político. A mistura deste campo, ao campo da fé é uma combinação inevitavelmente explosiva e nociva. Exemplos claros são as bancadas já constituídas parlamentares-religiosas, exemplos fanáticos e opressores de voto vicioso de seus fiéis, impedidos de poderem exercer a livre escolha dos candidatos oprimidas pelo argumento religioso.

E as maiores decepções desta eleição, repleta de episódios desagradáveis, foram os manifestos Espíritas e, pasmem, auto intituladas Livre Pensadores, contrários a este ou aquele determinado partido. Chegou-se ao auge da alucinação em afirmar que Espíritas, principalmente os Livre Pensadores, não deveriam votar em X candidato, por motivos Espíritas. Que contraditória a afirmação que um livre pensador de Kardec, por ser livre pensador de Kardec, não deveria votar em X candidato... A que ponto paradoxal a cegueira causada pela imaturidade Espirito-Politica chegou?

Em nossas ultimas filosofias, batemos na mesma tecla de que o Espírita deve vivenciar a Doutrina, não apenas a estudar. Os atos diários, a pratica, o lidar com o outro nas questões sociais são os fatores determinantes da Espiritualidade de alguém, não apenas o que ele lê, o que prega nas palestras, o cargo que ocupa nas casas. E esta eleição expos claramente o hiato existente entre o Filósofo Espirita (profundo conhecedor da doutrina) e o Praticante Espírita (que transpira seus valores éticos em suas ações). O Espírita, assim como qualquer cidadão, tem o direito de votar em quem ele acredita ser o melhor representante de suas ideias para governar a sociedade em que ele está inserido. Se, avaliando as argumentações do candidato, ele como eleitor acredita que se aproximem do que a Ética Espírita propõe, que vote em quem escolher.

Minha maior preocupação é que, talvez, o despreparo histórico para a política impeça esse eleitor Espirita de fazer essa ponte avaliatória entre a ética Espírita e a ética Politica proposta por esse ou aquele partido/candidato. Em geral, as avaliações são feitas isoladamente, olhando em separado, o cenário político, do cenário Espirita. Não há o cruzamento da Ética Espírita com as propostas dos futuros governantes a ponto de realmente embasar a escolha com um arcabouço de valores daquele individuo, escolhendo os políticos que irão governar a todos ao seu redor.
E essa escolha final deve ser particular, individual, fora dos bancos das casas Espiritas. Pelo simples fato de que não temos maturidade para lidar com ambas as questões ao mesmo tempo. E, ainda que tivéssemos, teríamos que ter, sobretudo, alteridade o suficiente, responsabilidade o suficiente e discernimento o suficiente para sair do centro sabendo que, ainda que a maioria julgue tal candidato ou partido melhor, eu posso escolher qualquer outro, sem prejuízo das amizades, sem julgamento moral, sem perder o vinculo com o grupo. Jovens políticos que somos não temos essa capacidade ainda.

 publicado no jornal ABERTURA em outubro de 2018

terça-feira, 13 de novembro de 2018

Maioridade Penal, uma reflexão espirita por Marcelo Regis

Maioridade Penal, uma reflexão espirita Marcelo Regis  Rio de Janeiro, 14°  SBPE setembro de 2015 


 I - Introdução 

Esse trabalho tem como objetivo refletir, sempre através das lentes da doutrina espírita, sobre esse tema atual e pulsante que é a redução ou não da maioridade penal no Brasil. Não temos a pretensão de esgotar o tema, nem mesmo analisar todas as facetas do problema. Nesse trabalho vamos nos ater a refletir sobe o tema usando como guia os conceitos morais espiritas, conforme ditados pela codificação kardequiana. Estão fora do escopo dessa reflexão questões jurídicopenais, bem como debater o sistema penal brasileiro e sua adequação para receber menores ou mesmo reintegrá-los a sociedade. O titulo do trabalho é propositadamente UMA reflexão espírita, pois sabemos que sendo a Doutrina Espirita uma doutrina de livres-pensadores, sem dogmas ou direção central ela permite muitas interpretações sobre esse tema, principalmente por se tratar de um tópico temporal, específico do momento atual em que vivemos e particularmente importante no contexto brasileiro onde a violência ocupa um lugar central nas preocupações da sociedade.  A reflexão que ora propomos, estará centrada nos conceitos de justiça divina e lei natural. É preciso esclarecer que a codificação espírita não contempla nenhuma questão especifica sobre esse assunto, provavelmente porque tal tema não era relevante quando da codificação kardequiana há mais de 170 anos atrás.  No Brasil o tema tomou suma importância, frente à escalada constante da violência e o debate sobre o efeito na mesma das resoluções estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), publicado em 1990. Atualmente encontram-se no congresso nacional inúmeras propostas de mudança tanto da constituição como do ECA, no sentido de alterar e na maioria das vezes endurecer as penalidades aplicadas a adolescentes infratores. Na maioria das vezes e como típico de nossa cultura, o debate é apaixonado e contaminado por preconceitos ideológicos e religiosos, sem muito espaço para aprofundamento sério, nem mesmo para entender experiências bem sucedidas em outros países.

II - Entendendo a Situação 

Para que possamos fazer a reflexão proposta, precisamos primeiramente entender a situação corrente no Brasil e no mundo sobre o tema. O tópico gera discussões apaixonadas, irracionais e na maioria das vezes sem nenhum embasamento teórico ou jurídico. Graças à difusão das redes sociais muitos conceitos errôneos, apresentados sem o devido contexto ou sem suporte estatístico são utilizados para defender ambas as teses. A briga nas redes sociais é quente e quase sem nenhum debate sério – na maioria das vezes posições são colocadas mas sem nenhuma chance do contraditório ou mesmo de se considerar os argumentos do “outro” lado.

Cabe aqui definir alguns conceitos importantes para o restante desse trabalho:

Maioridade Penal: o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa define “maioridade penal” como “condição de maioridade para efeitos criminais”. É a idade a partir da qual o indivíduo responde pela violação da lei penal na condição de adulto, sem qualquer garantia diferenciada reservada para indivíduos jovens.

Imputabilidade Penal: significa a possibilidade de se atribuir a responsabilidade pela violação de lei penal, ou seja, pela prática de um crime nos termos das leis penais. A inimputabilidade penal significa o oposto: a impossibilidade, de acordo com a lei, de se atribuir a responsabilidade pela violação de lei penal. A inimputabilidade penal tem várias hipóteses. Uma delas é a inimputabilidade por idade. Indivíduos podem ser considerados penalmente inimputáveis por estar abaixo de certa idade. A idade de imputabilidade penal não coincide, necessariamente, com a idade de maioridade penal. Os ordenamentos jurídicos podem reconhecer imputabilidade penal diferenciada para aqueles abaixo da idade de maioridade penal.

Existe uma confusão conceitual entre imputabilidade penal e maioridade penal. Imputabilidade penal significa à possibilidade de atribuir a responsabilidade pela violação de lei penal, ou seja, pela prática de um crime, entendida como ação ou omissão típica, antijurídica e culpável. Maioridade penal, por usa vez, refere-se à idade a partir da qual o indivíduo responde pela violação da lei penal na condição de adulto, sem qualquer garantia diferenciada reservada para indivíduos jovens. A lei pode reconhecer a imputabilidade penal de indivíduos com idade abaixo da maioridade penal, acarretando uma responsabilização de natureza penal diferenciada, sob a luz do chamado Direito Penal Juvenil.

II.1 - Brasil 

Atualmente, a maioridade penal é alcançada quando o indivíduo completa 18 (dezoito) anos – mesma idade em que se torna também maior no âmbito civil – conforme prevê a Constituição Federal em seu artigo 228, vejamos: Art. 228. “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”. Como vimos acima inimputável significa aquele a quem não pode ser imputado um crime, e, por consequência, uma sanção criminal, como disposto no código penal, que tipifica aquelas condutas a serem rechaçadas do convívio social e estipula os limites de pena a serem aplicados em cada caso concreto. No Brasil, uma das causas dessa confusão conceitual é o fato de que o ordenamento jurídico não faz distinção entre imputabilidade penal e maioridade penal - definindo a idade para ambos como sendo dezoito anos - mas ao mesmo tempo os adolescentes são responsabilizados à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) pela prática de ato infracional. Em consonância com a norma constitucional, o regime de infrações do Estatuto da Criança e do Adolescente não segue a sistemática típica do Direito Penal, baseada em tipos penais e penas mínimas e máximas para cada delito. O ECA não faz referência a penas ou crimes
praticados por adolescentes, mencionando apenas infrações e medidas socioeducativas, que não são individualizadas pelo estatuto para cada conduta específica. 

Os crimes praticados por menores de dezoito anos são legalmente chamados de “atos infracionais” e seus praticantes de “adolescentes em conflito com a lei” ou de "menores infratores". Aos praticantes são aplicadas “medidas socioeducativas” e se restringem apenas a adolescentes (pessoas com idade compreendida entre doze anos de idade completos e dezoito anos de idade incompletos. Todavia, a medida socioeducativa de internação poderá ser excepcionalmente aplicada ao jovem de até 21 anos, caso tenha cometido o ato aos quatorze anos). O ECA estabelece, em seu artigo 121, § 3º, quanto ao adolescente em conflito com a lei, que “em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos”, por cada ato infracional grave. Após esse período, ele passará ao sistema de liberdade assistida ou semiliberdade, podendo retornar ao regime fechado no caso de mau-comportamento.

II.2 - Pelo Mundo 

A responsabilidade criminal varia imensamente entre os diferentes países, conforme a cultura jurídica e social de cada um, indicando uma falta de consenso mundial sobre o assunto. Segundo informação fornecida pela Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), a  maioridade penal é a seguinte, nos países abaixo listados:

II.3 - Canadá: Para ilustrar melhor as diferenças vamos nos aprofundar na análise do tema no Canadá. Escolhemos o Canadá por sua tradição de respeito aos direitos humanos, tolerância com minorias e imigrantes.

No Canadá crianças com menos de 12 anos são inimputáveis, enquanto jovens entre 12 e 18 anos estão sujeitos a regime jurídico especial regido pela lei federal Youth Criminal Justice Act (YCJA), publicada em 2003. O objetivo dessa lei é proteger o público através de:  responsabilizar os jovens infratores, através de medidas e penas proporcionais a gravidade das faltas e o nível de responsabilidade dos mesmos  reabilitar os jovens infratores e auxiliar sua reintegração na sociedade, para que os mesmos se tornem cidadãos respeitadores das leis e membros ativos da comunidade  Atuar na prevenção de crimes, indicando jovens e adolescentes para programas e serviços que ataquem as causas e circunstâncias que levam a prática de ofensas a lei

Para aplicar essa lei existe o Youth Justice, ramo da justiça canadense separada do sistema adulto, onde os jovens são julgados em tribunais especiais. No caso das penas, o sistema canadense estabelece que o Juiz pode decidir entre as seguintes penas, de acordo com a gravidade da infração:  advertência;  multa, compensação ou restituição das vitimas pelas perdas materiais e financeiras  serviço comunitário ou prestação de serviços diretamente às vitima do crime  liberdade assistida/ regime aberto com supervisão  prisão em centros de custodia juvenis, podendo ser seguido de liberdade condicional. No caso de crimes mais graves, se aplicam programas de reabilitação intensiva dentro dos centro de custodia

As penas juvenis estão limitadas da seguinte forma:  Homicídio Qualificado: 10 anos, com máximo de 6 anos de reclusão e restante em liberdade assistida  Homicídio doloso: 7 anos, com máximo de 4 anos de reclusão e restante em liberdade assistida para 
 Outros crimes: máximo de 2 anos

No caso de jovens acima de 14 anos, culpados de crimes sérios – definidos como qualquer crime em que um adulto poder receber penas de mais de 2 anos de reclusão - o juiz pode determinar uma sentença conforme o código aplicado aos adultos, e nesse caso os limites acima não se aplicam. Por exemplo, um jovem de 14 a 17 anos pode ser sentenciado à prisão perpetua no caso de homicídio qualificado.

Notamos assim um balanço entre promover a reabilitação e reintegração dos jovens, mas também em responsabilizar os mesmos pelos atos cometidos. Apesar de emitir parâmetros claros e compreender medidas protetivas, o ordenamento canadense permite ao sistema judiciário certa autonomia em ajustar as penas de acordo com cada caso, principalmente os mais graves como exposto acima.

III - Considerações Espiritas 

III.1 - Posicionamento do Movimento Espirita Brasileiro: Uma pesquisa rápida na internet nos mostra que todas as manifestações de instituições e entidades espiritas são contra qualquer mudança na lei de maioridade penal brasileira. Transcrevemos o enunciado da Associação Jurídico Espirita, pois a mesma sumariza bem o pensamento presente no movimento espirita:

AJE-BRASIL (Associação Jurídico-Espírita do Brasil), por ocasião do 1º Fórum de Reflexões, ocorrido na Federação Espírita Brasileira (FEB), em Brasília, deliberou ser contrária à PEC 171/93, que pretende reduzir a maioridade penal no Brasil, fixando-a a partir de 16 anos, pelos seguintes motivos:

1. O Brasil é signatário da Convenção dos Direitos da Criança de 1989, da ONU, que reconhece que a criança – indivíduo menor de 18 anos – é merecedora de cuidados especiais e de proteção, por conta de sua falta de maturidade física e mental; 2. O adolescente – indivíduo de 12 a 18 anos incompletos segundo a legislação brasileira – é um ser cuja personalidade está em desenvolvimento físico, mental, moral e espiritual, devendo lhe ser garantido o sistema de maior proteção aos direitos fundamentais; 3. Para a hipótese de condutas definidas como crime, o sistema jurídico brasileiro, por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, já prevê medidas socioeducativas para a adequada responsabilização do adolescente, não havendo que se falar em impunidade; 4. Ao invés de se adotar o sistema punitivo de natureza penal a adolescentes de 16 a 18 anos, cumpre ampliar medidas concretas nas áreas de assistência social, moradia, esporte, lazer, saúde, educação, entre outras; 5. A inserção de adolescentes no sistema carcerário – que se apresenta superlotado, em condições subumanas, portanto, sem estrutura mínima para cumprir o fim de ressocialização da pena e para atender à dignidade da pessoa
humana implica aumentar os efeitos deletérios desta realidade, com prejuízo para o cidadão e para sociedade em geral; 6. Dados estatísticos comprovam que a maior incidência da lei penal dá-se em relação a adolescentes pobres, negros e com baixo grau de alfabetização, o que revela a seletividade do sistema punitivo. De outro lado, o número de crimes praticados por adolescentes é baixo, em torno de 0,1425% (IBGE); 7. As políticas públicas devem buscar a emancipação do ser – em especial do adolescente que se encontra em desenvolvimento – em detrimento do aumento de medidas repressivas, o que se faz por meio da educação, que proporciona o aperfeiçoamento moral e intelectual do espírito imortal; 8. A lei humana deve privilegiar a ampliação e não a restrição dos direitos fundamentais, visando à construção de uma sociedade justa e fraterna; 9. A educação deve ser vista como prioritária e permanente opção para a evolução humana. Logo, a proposta em debate – de aumento de medida repressiva em prejuízo da adoção de medida de natureza educativa – se aprovada, representa retrocesso social e espiritual para os destinos da sociedade brasileira. AJE – Associação Jurídico Espírita Brasília, abril de 2015.

III.2 - Lei Natural e Lei Humana  Em "O Livro dos Espíritos", a justiça a qual um encarnado está sujeito é regulada pela "lei natural" e pela "lei humana" (ver subquestão (a) da questão # 875).  Os questionamentos feitos por Kardec dizem respeito, majoritariamente, à lei natural, já que a lei humana é específica conforme o tempo, a cultura e a sociedade. Apesar de tocar em vários pontos específicos acerca das leis humanas, não encontramos referencia direta em O Livro dos Espíritos sobre maioridade penal e/ou crimes cometidos por menores de idade. Isso posto, em vários pontos Kardec e os Espíritos provém diretrizes e guias que podem ajudar nossa reflexão.

A diretriz máxima da Lei Natural está exposta na questão #876 "Queira cada um para os outros o que quereria para si mesmo".  A questão # 877 complementa a anterior com relação ao primeiro dever que é "respeitar os direitos de seus semelhantes". Ainda segundo a lei natural, explicam os Espíritos na questão # 880, o primeiro de todos os direitos naturais do homem: “O de viver. Por isso é que ninguém tem o de atentar contra a vida de seu semelhante, nem de fazer o que quer que possa comprometer-lhe a existência corporal.”

Quanto a ação da sociedade no encaminhamento da criança e do adolescente (segundo a lei natural) está toda sob a tutela da paternidade. Aqui encontramos o campo de maior efeito sobre os atos das crianças.  Por causa disso, a questão 582 qualifica a paternidade como uma missão:

582. Pode-se considerar como missão a paternidade?   “É, sem contradita possível, uma verdadeira missão. Constitui, ao mesmo tempo grandíssimo dever, que empenha, mais do que o pensa o homem, a sua
responsabilidade quanto ao futuro. Deus colocou o filho sob a tutela dos pais, a fim de que estes o dirijam pela senda do bem, e lhes facilitou a tarefa dando àquele uma organização física débil e delicada, que o torna propício a todas as impressões. Muitos há, no entanto, que mais cuidam de endireitar as árvores do seu jardim e de fazê-las dar bons frutos em abundância, do que de endireitar o caráter de seu filho. Se este vier a sucumbir por culpa deles, suportarão os desgostos resultantes dessa queda e partilharão dos sofrimentos do filho na vida futura, por não terem feito o que lhes estava ao alcance para que ele avançasse na estrada do bem.”

portanto, segundo a lei natural, a educação dos filhos é de responsabilidade dos pais. É pela falta ou ausência desses, porém, que a criminalidade infantil pode se tornar um problema da sociedade (como condição necessária, mas não suficiente, para manifestação dessa criminalidade). 

583. São responsáveis os pais pelo transviamento de um filho que envereda pelo caminho do mal, apesar dos cuidados que lhe dispensaram?  “Não; porém, quanto piores forem as propensões do filho, tanto mais pesada é a tarefa e tanto maior o mérito dos pais, se conseguirem desviá-lo do mau caminho.”

Sabendo-se que os espíritos reencarnados tem toda uma bagagem de varias existências passadas, sabemos que as crianças e adolescentes trazem consigo qualidades, defeitos e experiências anteriores muitas vezes com tendência a pratica do mal que pode aflorar através de ações delinquentes se educação e limites não forem estabelecidos a partir do lar.

Finalmente, não deixa de ser elucidativa a questão # 796 que aparece na III Parte do Capítulo VIII do "Livro dos Espíritos": 796. No estado atual da sociedade, a severidade das leis penais não constitui uma necessidade?

“Uma sociedade depravada certamente precisa de leis severas. Infelizmente, essas leis mais se destinam a punir o mal depois de feito, do que a lhe secar a fonte. Só a educação poderá reformar os homens, que, então, não precisarão mais de leis tão rigorosas.”

III.3 - Livre-arbítrio e Responsabilidade Individual Em vários pontos da Doutrina Espirita os espíritos deixam claro que no limite, cada individuo é o artificie e responsável por sua existência, seus atos e por sua própria evolução. Kardec expõe esse tópico magistralmente na questão 872, que apesar de extensa transcrevemos aqui por sua importância: 

872. A questão do livre-arbítrio se pode resumir assim: O homem não é fatalmente levado ao mal; os atos que pratica não foram previamente determinados; os crimes que comete não resultam de uma sentença do destino. Ele pode, por prova e por expiação, escolher uma existência em que seja arrastado ao crime, quer pelo meio onde se ache colocado, quer pelas circunstâncias que
sobrevenham, mas será sempre livre de agir ou não agir. Assim, o livre-arbítrio existe para ele, quando no estado de Espírito, ao fazer a escolha da existência e das provas e, como encarnado, na faculdade de ceder ou de resistir aos arrastamentos a que todos nos temos voluntariamente submetido. Cabe à educação combater essas más tendências. Fá-lo-á utilmente, quando se basear no estudo aprofundado da natureza moral do homem. Pelo conhecimento das leis que regem essa natureza moral, chegar-se-á a modificá-la, como se modifica a inteligência pela instrução e o temperamento pela higiene. Desprendido da matéria e no estado de erraticidade, o Espírito procede à escolha de suas futuras existências corporais, de acordo com o grau de perfeição a que haja chegado e é nisto, como temos dito, que consiste sobretudo o seu livrearbítrio. Esta liberdade, a encarnação não a anula. Se ele cede à influência da matéria, é que sucumbe nas provas que por si mesmo escolheu. Para ter quem o ajude a vencê-las, concedido lhe é invocar a assistência de Deus e dos bons Espíritos.  Sem o livre-arbítrio, o homem não teria nem culpa por praticar o mal, nem mérito em praticar o bem. E isto a tal ponto está reconhecido que, no mundo, a censura ou o elogio são feitos à intenção, isto é, à vontade. Ora, quem diz vontade diz liberdade. Nenhuma desculpa poderá, portanto, o homem buscar, para os seus delitos, na sua organização física, sem abdicar da razão e da sua condição de ser humano, para se equiparar ao bruto. Se fora assim quanto ao mal, assim não poderia deixar de ser relativamente ao bem. Mas, quando o homem pratica o bem, tem grande cuidado de averbar o fato à sua conta, como mérito, e não cogita de por ele gratificar os seus órgãos, o que prova que, por instinto, não renuncia, malgrado à opinião de alguns sistemáticos, ao mais belo privilégio de sua espécie: a liberdade de pensar. A fatalidade, como vulgarmente é entendida, supõe a decisão prévia e irrevogável de todos os sucessos da vida, qualquer que seja a importância deles. Se tal fosse a ordem das coisas, o homem seria qual máquina sem vontade. De que lhe serviria a inteligência, desde que houvesse de estar invariavelmente dominado, em todos os seus atos, pela força do destino? Semelhante doutrina, se verdadeira, conteria a destruição de toda liberdade moral; já não haveria para o homem responsabilidade, nem, por conseguinte, bem, nem mal, crimes ou virtudes. Não seria possível que Deus, soberanamente justo, castigasse suas criaturas por faltas cujo cometimento não dependera delas, nem que as recompensasse por virtudes de que nenhum mérito teriam.

Demais, tal lei seria a negação da do progresso, porquanto o homem, tudo esperando da sorte, nada tentaria para melhorar a sua posição, visto que não conseguiria ser mais nem menos. Contudo, a fatalidade não é uma palavra vã. Existe na posição que o homem ocupa na Terra e nas funções que aí desempenha, em consequência do gênero de vida que seu Espírito escolheu como prova , expiação  ou missão . Ele sofre fatalmente todas as vicissitudes dessa existência e todas as tendências  boas ou más, que lhe são inerentes. Aí, porém, acaba a fatalidade, pois da sua vontade depende ceder ou não a essas tendências. Os pormenores dos acontecimentos, esses ficam subordinados às circunstâncias que ele próprio cria pelos seus atos ,
sendo que nessas circunstâncias podem os Espíritos influir pelos pensamentos que sugiram. Há fatalidade, portanto, nos acontecimentos que se apresentam, por serem estes consequência da escolha que o Espírito fez da sua existência de homem. Pode deixar de haver fatalidade no resultado de tais acontecimentos, visto ser possível ao homem, pela sua prudência, modificar-lhes o curso. Nunca há fatalidade nos atos da vida moral. No que concerne à morte é que o homem se acha submetido, em absoluto, à inexorável lei da fatalidade, por isso que não pode escapar à sentença que lhe marca o termo da existência, nem ao gênero de morte que haja de cortar a esta o fio. Segundo a doutrina vulgar, de si mesmo tiraria o homem todos os seus instintos, que, então, proviriam, ou da sua organização física, pela qual nenhuma responsabilidade lhe toca, ou da sua própria natureza, caso em que lícito lhe fora procurar desculpar-se consigo mesmo, dizendo não lhe pertencer a culpa de ser feito como é. Muito mais moral se mostra, indiscutivelmente, a Doutrina Espírita. Ela admite no homem o livre-arbítrio em toda a sua plenitude e, se lhe diz que, praticando o mal, ele cede a uma sugestão estranha e má, em nada lhe diminui a responsabilidade, pois lhe reconhece o poder de resistir, o que evidentemente lhe é muito mais fácil do que lutar contra a sua própria natureza. Assim, de acordo com a Doutrina Espírita, não há arrastamento irresistível: o homem pode sempre cerrar ouvidos à voz oculta que lhe fala no íntimo, induzindoo ao mal, como pode cerrá-los à voz material daquele que lhe fale ostensivamente. Pode-o pela ação da sua vontade, pedindo a Deus a força necessária e reclamando, para tal fim, a assistência dos bons Espíritos. Foi o que Jesus nos ensinou por meio da sublime prece que é a Oração dominical , quando manda que digamos: “Não nos deixes sucumbir à tentação, mas livra-nos do mal.” Essa teoria da causa determinante dos nossos atos ressalta com evidência de todo o ensino que os Espíritos hão dado. Não só é sublime de moralidade, mas também, acrescentaremos, eleva o homem aos seus próprios olhos. Mostra-o livre de subtrair-se a um jugo obsessor, como livre é de fechar sua casa aos importunos. Ele deixa de ser simples máquina, atuando por efeito de uma impulsão independente da sua vontade, para ser um ente racional, que ouve, julga e escolhe livremente de dois conselhos um. Aditemos que, apesar disto, o homem não se acha privado de iniciativa, não deixa de agir por impulso próprio, pois que, em definitivo, ele é apenas um Espírito encarnado que conserva, sob o envoltório corporal, as qualidades e os defeitos que tinha como Espírito. Conseguintemente, as faltas que cometemos têm por fonte primária a imperfeição do nosso próprio Espírito, que ainda não conquistou a superioridade moral que um dia alcançará, mas que, nem por isso, carece de livre-arbítrio. A vida corpórea lhe é dada para se expungir de suas imperfeições, mediante as provas por que passa, imperfeições que, precisamente, o tornam mais fraco e mais acessível às sugestões de outros Espíritos imperfeitos, que delas se aproveitam para tentar fazê-lo sucumbir na luta em que se empenhou. Se dessa luta sai vencedor, ele se eleva; se fracassa, permanece o que era, nem pior, nem melhor. Será uma prova que lhe cumpre recomeçar, podendo suceder que longo tempo gaste nessa alternativa. Quanto mais se depura, tanto mais diminuem os seus pontos fracos e tanto menos acesso oferece aos que procurem
atraí-lo para o mal. Na razão de sua elevação, cresce-lhe a força moral, fazendo que dele se afastem os maus Espíritos. Todos os Espíritos, mais ou menos bons, quando encarnados, constituem a espécie humana e, como o nosso mundo é um dos menos adiantados, nele se conta maior número de Espíritos maus do que de bons. Tal a razão por que aí vemos tanta perversidade. Façamos, pois, todos os esforços para a este planeta não voltarmos, após a presente estada, e para merecermos ir repousar em mundo melhor, em um desses mundos privilegiados, onde não nos lembraremos da nossa passagem por aqui, senão como de um exílio temporário.

Os espíritos corroboram tal argumento ao tratarem do Bem e do Mal e da influencia do meio nas ações individuais nas questões 637, 638, 639, 644 e 645 que transcrevemos a seguir:

637. Será culpado o selvagem que, cedendo ao seu instinto, se nutre de carne humana? “Eu disse que o mal depende da vontade. Pois bem! Tanto mais culpado é o homem, quanto melhor sabe o que faz.” As circunstâncias dão relativa gravidade ao bem e ao mal. Muitas vezes, comete o homem faltas, que, nem por serem consequência da posição em que a sociedade o colocou, se tornam menos repreensíveis. Mas, a sua responsabilidade é proporcional aos meios de que ele dispõe para compreender o bem e o mal. Assim, mais culpado é, aos olhos de Deus, o homem instruído que prati- ca uma simples injustiça, do que o selvagem ignorante que se entrega aos seus instintos.

638. Parece, às vezes, que o mal é uma consequência da força das coisas. Tal, por exemplo, a necessidade em que o homem se vê, nalguns casos, de destruir, até mesmo o seu semelhante. Poder-se-á dizer que há, então, infração da lei de Deus?  “Embora necessário, o mal não deixa de ser o mal. Essa necessidade desaparece, entretanto, à medida que a alma se depura, passando de uma a outra existência. Então, mais culpado é o homem, qua quando o pratica, porque melhor o compreende.”

639. Não sucede freqüentemente resultar o mal, que o homem pratica, da posição em que os outros homens o colocam? Quais, nesse caso, os culpados?  “O mal recai sobre quem lhe foi o causador. Nessas condições, aquele que é levado a praticar o mal pela posição em que seus semelhantes o colocam tem menos culpa do que os que, assim procedendo, o ocasionaram. Porque, cada um será punido, não só pelo mal que haja feito, mas
também pelo mal a que tenha dado lugar.”

644. Para certos homens, o meio onde se acham colocados não representa a causa primária de muitos vícios e crimes? “Sim, mas ainda aí há uma prova que o Espírito escolheu, quando em liberdade, levado pelo desejo de expor-se à tentação para ter o mérito da resistência.”

645. Quando o homem se acha, de certo modo, mergulhado na atmosfera do vício, o mal não se lhe torna um arrastamento quase irresistível? “Arrastamento, sim; irresistível, não; porquanto, mesmo dentro da atmosfera do vício, com grandes virtudes às vezes deparas. São Espíritos que tiveram a força de resistir e que, ao mesmo tempo, receberam a missão de exercer boa influência sobre os seus semelhantes.”

IV - Considerações Finais 

O espiritismo claramente define o individuo como responsável por seus atos e ações. Mesmo inserido em seu meio, e sujeito as influencias externas, o espirito tem sempre o livre-arbítrio e o poder de escolher entre praticar o bem ou o mal. Assim também são aplicadas suas penas e gozos futuros – ou seja individualizadas. Isso dito, fica claro que atenuantes devem ser considerados e que as penas são proporcionais as faltas e que não somente as ações são levadas em conta, mas também o contexto, as intenções e situações.  Dessa forma me parece obvio que qualquer posicionamento espirita sobre aprimoramento das leis humanas, aproximando-as da Lei Natural, deve incluir responsabilização individualizada, contextualizada nas condições dos fatos. Portanto, na questão da maioridade penal fica claro que necessitamos de aperfeiçoamentos aqui no Brasil, principalmente para adequar as penas e reparações a gravidade dos fatos. O ECA ao não permitir que a responsabilização seja proporcional ao delito, individualizada e ao aplicar soluções genéricas, restringe e limita uma melhor analise do fatos, contexto e consequências. Privilegiando somente um lado da equação, ou seja, considerando o menor infrator apenas como vitima maior da sociedade, as ações previstas no ECA são ajustadas sob essa perspectiva. O espiritismo, ao elevar o individuo como artífice máximo de sua própria existência, entende que um melhor balanço precisa ser atingido. Para tanto uma possível solução seria incluir no ordenamento jurídico nacional uma adequação que permitisse que o jovem infrator fosse também responsabilizado por seus atos, proporcionalmente a gravidade, consequência e contexto da mesma. Esse vetor, aliado aos vetores de reabilitação e prevenção estariam mais em consonância com os preceitos e moral definidos pelo espiritismo. Nesse debate, não precisaríamos necessariamente de nenhuma redução da idade da maioridade penal, hoje estabelecida aos 18 anos. Porém necessitaríamos
retirar da constituição a inimputabilidade de menores de 18 anos para que os mesmos possam ter reconhecidas sua responsabilidade perante a sociedade. Temos também que redefinir o ECA para que o mesmo permita a sociedade, através do poder judiciário e de suas varas especializadas na criança e na juventude possa melhor definir e aplicar penas reparatórias e proporcionais aos jovens infratores. O exemplo canadense parece bem equilibrado e algo que pode servir de parâmetro a sociedade brasileira. Um ordenamento jurídico baseado no tripé: - Responsabilizar individualmente o jovem por seus atos e que o mesmo possa, no possível, reparar os danos causados as vitimas; - Suporte da sociedade para que o jovem infrator possa ser reabilitado e reinserido na sociedade; - Foco em prevenção, através da valorização da família e educação;

Parece bem em consonância com o ensinado pela doutrina espirita e a meu ver seria um grande avanço na legislação brasileira, permitindo que nossa sociedade continue progredindo e avançando suas leis rumo a lei divina e natural.


Bibliografia/ Websites Consultados:

 Kardec, Allan – O Livro dos Espíritos; Ed. FEB
 American Juvenile Justice System (https://en.wikipedia.org/wiki/American_juvenile_justice_system)
 Canada, British Columbia - Youth Justice Section of JusticeBC (http://www.justicebc.ca/en/cjis/youth/)
 Maioridade penal   (https://pt.wikipedia.org/wiki/Maioridade_penal#cite_note-71)
 Xavier, Ademir - Redução da Maioridade Penal e Espiritismo em Blog Era do Espírito  http://eradoespirito.blogspot.com.br/2015/04/reducao-da-maioridade-penale.html
 ONU, Comitê sobre os Direitos da Criança (25/4/2007). Children’s rights in juvenile justice. GENERAL COMMENT No. 10 (2007) http://www2.ohchr.org/english/bodies/crc/docs/CRC.C.GC.10.pdf
 Children in the US Justice System Amnesty International USA). (http://www.amnestyusa.org/news?id=D94FCE82406321E18025690000692 DCA&lang=e)
 Estatuto da Criança e do Adolescente; http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm
 A maioridade penal na visão da AJE – Associação Jurídico-Espírita do Brasil; Publicado por Rádio Boa Nova  http://radioboanova.com.br/jornal-nova-era/maioridade-penal-na-visao-daaje-associacao-juridico-espirita-brasil/

 

segunda-feira, 16 de abril de 2018

A mulher, seu dia, seu mês, sempre mulher! Na Ótica Espírita - por Alexandre Cardia Machado


A mulher, seu dia, seu mês, sempre mulher!
Um pouco de história: O Dia Internacional da Mulher é celebrado em 8 de março. A história de lutas por direitos iguais inicia-se no século XIX, é sustentada por movimentos socialistas na europa e Estados Unidos durante a primeira metade do século XX e finalmente é reconhecida pela ONU, na década de 70, no ano de 1975. Foi designado como o Ano Internacional da Mulher e o dia 8 de março foi adotado como o Dia Internacional da Mulher.. Seu objetivo é lembrar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres, independente de divisões nacionais, étnicas, linguísticas, religiosas, culturais, econômicas ou políticas.
Transcrevo um texto que não tem autor identificado, do blog espírita “ letraespírita”
“A história do empoderamento feminino é mais antiga do que você pode imaginar. Diferente do que muitos pensam, não é uma causa de uma pessoa ou organização. Empoderar uma mulher engloba tudo o que qualquer pessoa pode fazer para fortalecer as mulheres e desenvolver a igualdade de gênero nos âmbitos onde as mulheres são a minoria.

Este artigo foi publicado no jornal ABERTURA de março de 2018: Baixe aqui!



Quais são os 7 princípios do empoderamento feminino?

Desde 2010, existe um documento chamado “Os Princípios de Empoderamento das Mulheres”, lançado pela Organização das Nações Unidas (ONU), para mostrar às empresas e comunidades como dar poder para as mulheres”.  As notas entre parenteses são do autor deste editorial:

“1. Estabelecer liderança corporativa, no mais alto nível, com sensibilidade à igualdade de gênero; ( O Livro dos Espíritos já antecipava isto ainda no meio do século XIX, em 1857)
2. Tratar todas as pessoas, independente do gênero, de maneira justa no ambiente de trabalho, com respeito e apoio aos direitos humanos e à não discriminação; (alinhada com o pensamento Espírita)
3. Garantir saúde, bem-estar e segurança para todas as mulheres e homens que fazem parte de uma organização profissional; (Lei de Igualdade)
4. Promover a educação, o desenvolvimento profissional e a capacitação a todas as mulheres; (medida esta universal, não cabendo somente à mulher)
5. Apoiar o empreendedorismo feminino e promover políticas que deem poder às mulheres por meio de cadeias de suprimento e marketing;
6. Promover a igualdade de gênero, por meio de ações direcionadas à comunidade e ao ativismo social;
7. Medir e documentar os progressos de qualquer empresa na promoção da igualdade de gênero. (grandes empresas, especialmente as multinacionais, costumam ter algum tipo de valorização forçada para minorias, mulhers, negras, latinas etc, como forma de diminuir a desigualdade)”
Mais detalhes sobre o empoderamento da mulher podem ser encontrados no link:
Qualquer artigo espírita sobre a mulher nos dias atuais deveria abordar pelo menos os seguintes assuntos: igualdade de direitos; igualdade de rendimentos, onde hoje vemos a mulher inserida em todas as profissões; igualdade de raças e em especial  o crescimento da valorização da mulher negra e de outras minorias; os abusos contra a mulher;  o papel da mulher na política e a participação da mulher no Movimento Espírita. O Espiritismo não pode se furtar desta discussão, que afeta 50% dos espíritos encarnados.
Não é concebível que ainda existam preconceitos quanto a capacidade da mulher, eles erram e acertam como os homens, hoje temos a presidência do Supremo Tribunal Federal, nas mãos da Ministra Carmen Lúcia, já tivemos uma presidente mulher eleita duas vezes, temos comandantes de navios, embarcadas em submarinos, médicas, engenheiras, presidindo casas espíritas enfim em todas as atividades possíveis e imagináveis.
Este jornal, como demonstrado no 15° Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita, sempre debateu as questões que afetam o emponderamento feminino, ainda, claro, sem conhecer este termo.
Viva a igualdade!

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Pau que nasce torto as vezes se endireita - por Alexandre Cardia Machado

Pau  que nasce torto as vezes se endireita

Gostaríamos de falar de uma iniciatva que já conta com 10 anos, trata-se do Prêmio Trip Transformadores – realizado pela Revista Trip, neste ano padrocinada pelo Grupo Boticário junto com outros onze co-patrocinadores. A ideia do prêmio veio de Paulo Lima, Editor – Presidente da revista.

Este Prêmio tem por objetivo identificar, brasileiros capazes de recriar a noção de desenvolvimento humano, transformando a realidade. Isto tem tudo a ver com o Jornal Abertura, onde sempre que possível buscamos chamar a atenção para aqueles que fazem algo de bom pela sociedade, aqules que demonstram o Caráter do Homem (ou Mulher) de Bem.

A revista, em edição especial, impressa em papel reciclado, em seu editorial escreve o que buscamos destacar aqui: “Você acredita no Brasil? Deveria. Por alguns minutos desapegue-se das imagens mal construídas do país que você vive. Esqueça a corrupção de colarinho branco que parece minimizar a honestidade de um povo. Acredite que há mesmo quem tira dinheiro do bolso para ajudar os outros. Conteste com veemência a máxima de que pau que nasce torto nunca se endireita. Quem contou isso para você mentiu.”

Li a revista, num voô entre Porto Alegre e São Paulo, leitura fácil, as pessoas que lá foram reconhecidas são muito diferentes umas das outras, o que elas tem em comum é o fazer acontecer as mudanças, no campo social, na cultura ou na transformação para melhor do mundo ao seu redor.
Escolhi um caso que bem representa o que no Espiritismo chamamos do progresso que o Espírito experimenta em sua encarnação, nunca é tarde para mudar. Ainda que mais raro, é possível sim mudar alguém que está em um presídio, ou que caminhou no mau, por muito tempo, não há uma solução única, mas se oferecermos alternativas, alguns conseguirão melhorar. Jacira Jacinto da Silva, Presidente da CEPA, em seu livro Criminalidade: Educar ou Punir, assim se refere à situações semelhantes a que busco mostrar aqui: “ As lições do espiritismo nos ensinam a enxergar que todas as pessoas, incluíndo as que nasceram e cresceram sem oportunidade, e até mesmo as que cometeram infrações graves à ordem social, têm perspectiva de sucesso, pois fomos criados para aprender e crescer indefinidamente”.

Escreveremos sobre Luiz Alberto Mendes, escritor e colunista da revista Trip, autor de 6 livros, esteve preso por 31 anos no presídio do Carandirú, na cidade de São Paulo, tendo o peso sobre si de pelo menos dois assassinatos. Saiu de casa aos 12 anos, para fugir de um pai alcólatra que batia na esposa e nos filhos, vivendo nas ruas até os 19 anos quando foi preso. Não se importava com nada, não via perspectiva na vida. Assim passou um bom tempo na cadeia, até que veio a epidemia de AIDS, nos anos 80 do século passado, que infestou os presídios.

Luiz relata que não havia profissionais de saúde em número suficiente no Carandirú e por um impulso ele resolveu se importar com aquilo e fazer algo no presídio, foi ajudar no cuidado aos pacientes. Foi quando uma conheceu uma enfermeira travesti que gostava muito de ler. Ali surgiu uma amizade.Ela foi a primeira a lhe mostrar a importância da leitura. 

A transformação foi imediata, do não fazer nada o dia inteiro, passou a ser um leitor voraz, passou a ler 10 horas por dia. Em meio a dor e a agonia do presídio conheceu a obra de Jean Paul Sarte, a quem admira, mas a quem se propõe  discordar, Sarte disse “ O inferno são os outros” ele contesta “ O inferno é a ausência dos outros”. Esta reflexão demonstra que ele foi capaz de perceber que a importância da relação com o outro, perceber a importância da outra pessoa nos humaniza.

O conhecimento melhora a vida, desde que não seja ornamental, ou seja apenas para distração. A leitura tem o potencial de ser um transformador de estrutura mental e por consequência fazer com que passemos da ideia à ação.

Pesquisando um pouco mais encontramos uma entrevista de Luiz Mendes, onde ele explica um pouco melhor como iniciou o interesse pela leitura e a explicação para a frase colocada acima.

O contato começa com uma mulher que trocava conversa comigo por cartas. Essa história tem início bem antes, pois quando fui preso eu não sabia escrever carta direito e um amigo me ensinou a escrevê-la, com rascunho e eu passava a limpo para enviar à minha mãe. Então chegou um momento em que comecei a modificar a carta, porque eram relatos íntimos com minha mãe, até que num ponto comecei a escrever sozinho. Fui escrevendo para outras pessoas também até chegar nessa professora, que morava no Rio de Janeiro, estava se formando em Letras, gostava de literatura e me mandava os livros importantes para eu ler. Os primeiros livros que eu me apaixonei foram os de Érico Veríssimo.”
Este relato, lembra um pouco o que descrevem os romances espíritas, onde as palavras de amor, e de esclarecimento, abrem um espaço na mente do espírito, por onde o amor penetra. Não foi bem assim com Luiz, demorou um bom tempo, em suas próprias palavras, já bem mais maduro afirma, “não foram os livros que me salvaram, mas as pessoas que me enviram os livros”. Esta frase denota toda uma perspectiva filosófica e não mítica de Luiz. 

Em algum momento a ação transformadora da leitura, transformou Luiz em um ser moral que se preocupa com o bem estar e os direitos dos outros.

Luiz Mendes hoje dá palestras, ajuda com seus livros outras pessoas a sair da marginalidade, ele não é espírita, o texto não tem nenhuma referência a religião, pela proximidade com Sarte, tudo leva a crer que seja materialista. Mas seja como for o Espírito tem em si mesmo o impulso do progresso e mais uma vez parafrasiando Sarte “ Liberdade é o que você faz com aquilo que aconteceu com você”.

 A lei do progresso é de ação permanente pois sempre queremos, ou almejamos algo a mais para nós mesmos ou para a nossa sociedade.


sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

A poética das vidas intinerantes - Por Ciro Pirondi

A Poética das Vidas Itinerantes


Ciro Pirondi*


O olhar estético sobre a existência comumente é associado à dimensão do desnecessário, do supérfluo. Nosso comprometimento com a lógica, com a razão, ensinou-nos a ver na estética, no belo, seus contrários. “Não precisa ser belo, deve funcionar...”, frase comum de ouvirmos no cotidiano das pessoas.

Ciro Pirondi


A “eficiência” toma conta do mundo, do Homem Máquina, razão, capaz de entender tudo, construir máquinas cada vez mais perfeitas, em uma sociedade comprometida com a produção em série, com o desespero pelo consumo priorizando o crescimento econômico. Tratamos cada vez mais a educação como se seu objetivo principal fosse ensinar os alunos a serem economicamente produtivos, ao invés de ensiná-los a raciocinar criticamente e a se tornarem cidadãos instruídos e compreensivos. A perda dessas capacidades básicas põe em risco a saúde das democracias e a esperança de um mundo decente. Somos uma máquina de ansiedade, ligada no automático, em uma sociedade desorientada.
O homem máquina é consequência de um sistema de valores baseado no lucro e no sucesso individual. O trabalho, via de regra, é punitivo e a insegurança consome nossas energias.
Nesse contexto da máquina como espelho, não podemos admitir o erro com um olhar acolhedor, e entender que falhar nos ajuda a crescer e construir um caminho com múltiplas possibilidades. Difícil pensar assim em uma sociedade na qual a palavra de ordem é eficiência. Somos uma engrenagem constituída para produzir sem reflexão, sem questionar. Esquecemos do velho provérbio indiano sobre a transformação: “A nuvem bebe água salgada e chove água doce”.

Livreto distribuído pelo autor no XIV SBPE


Estamos com o botão da reflexão crítica desligado.

Esse estado de cegueira está nos levando a desconfiar do futuro; no entanto, o mundo só melhorou. A média de longevidade ampliou-se muito; as tecnologias diminuíram o trabalho braçal; os meios de comunicação encurtaram a distância entre os homens; pensamos com muita seriedade na possibilidade de construirmos cidades e civilizações em outros planetas.

Habitar o universo.

Contraditoriamente, no entanto, não diminuímos a distância entre ricos e pobres; marginalizamos as mulheres; praticamos chacinas como as de Osasco; discriminamos as minorias; o poder está nas mãos de incapazes...

A aflição de nossa solidão, como descreve o sublime Garcia Márquez, nos faz continuar buscando nossa Macondo ou com Homero, a eterna travessia de Odisseu (o Ulisses romano), em sua jornada pelos mares revoltos. Vezes em lugares mágicos. Vezes em situações terríveis, a nos mostrar ser mais importante na travessia da vida, não onde vamos chegar ao final, mas a maneira como seguimos por ela.

Se optarmos por seguir como máquinas, talvez “a máquina do Mundo”, como no belo poema de Drummond, nos destrua. Mas se amplificarmos as fronteiras do que ainda temos para
descobrir, inventar novas alternativas, com serenidade e sabedoria e entendermos que todo excesso nega o fim proposto, desenhando os caminhos do meio de Buda, não permitindo que o crescimento econômico sirva apenas para destruir a natureza; criar profundas desigualdades, descontentamento e violência entre os desfavorecidos e marginalizados.

O que importa saber é: quais são os ideais políticos, éticos deste homem máquina? Se ele pretende ou ajuda construir uma sociedade justa, humana e compassível?

Penso ser a possibilidade de vidas itinerantes uma alternativa possível.

Fundamento este raciocínio na dimensão de tempo que esta alternativa possibilita. Tempo onde todo o universo flui e se insere; incluso a vida, as fragilidades e sua rapidez.

Como é possível apenas 80 ou 90 anos para aprendermos os conhecimentos já descobertos? Como podemos educar nossos ouvidos e vistas às belezas da música e das artes em apenas 80 anos?

O Espiritismo, como é natural para o período no qual ele surgiu; apostou todas suas reflexões na lei de causa e efeito de maneira cartesiana, ou seja, a toda ação corresponde uma relação direta e imutável, muito ainda influenciada pelo conceito de punição e pecado. E, em um segundo preceito, o da supremacia da razão. Razão pura, Kantiana, crítica e único caminho possível para evoluirmos e encontrarmos a plenitude da vida.

O século XX e XXI nos inundou de outras possibilidades.

Pierre Lévy em seu texto “Inteligência coletiva” afirma: ‘Hoje, o Homo sapiens enfrenta a rápida modificação de seu meio, da qual ele é o agente coletivo, involuntário’. Sugere a via da inteligência coletiva. Tenho a intuição ser este o caminho capaz de produzir novos sistemas de signos, nova forma de organização social, e regulação que nos permitiriam pensar em conjunto.

Nossas forças intelectuais e espirituais multiplicaram nossas imaginações e experiências.

Aprenderíamos, aos poucos, diz o filósofo, a “nos orientar num cosmo em mutação”.

A razão, por si, como pensávamos no século XIX, não basta. A vida é mais bela e complexa. Não cabe em uma lei que pretendia ser totalitária e completa.

Arthur Conan Doyle, por exemplo, um escritor de inteligência iluminada e com uma imaginação invejável, com seu principal personagem - Sherlock Holmes -, chega a afirmar em seu livro “A História do Espiritismo”, que se a reencarnação não fosse uma verdade, precisaria ser inventada para satisfazer a razão. Mesmo um homem de brilho raro como ele, joga tudo na razão.

As reflexões apresentadas aqui no Simpósio Brasileiro do Pensamento Espirita visam compartilhar e apontar a possibilidade de acrescermos a dimensão poética da existência, conjuntamente à razão, à lógica tão valorizada nos meios acadêmicos e espíritas.

Compreendermos e valorizarmos, de verdade, as descobertas artísticas; educarmos nossos ouvidos para percebermos nas sonatas de Mozart tanto valor para o desenvolvimento humano, quanto nas descobertas de Newton ou Einstein; ele mesmo um exímio violinista que afirmava serem elas, as sonatas de Mozart, a expressão mais próxima de sua concepção de desenho do universo.

Se em alguns milênios o Homo habilis tornou-se sapiens, rompeu uma barreira, lançou-se no desconhecido, inventou a Terra, os deuses e o mundo infinito de significação, o que proponho aqui é inventarmos, uma inteligência coletiva, capaz de associar Razão e poética à dimensão das vidas itinerantes. Criarmos uma nova linguagem para o Espiritismo. Este é o nosso principal desafio para este século, cujo resultado não veremos, pois as mudanças de linguagens são obras de gerações.
Mas devemos intuir algo novo. Podemos e desejamos, por pura alegria, contar aos “outros” o quanto é bom e leve sabermos sermos seres projetados no tempo, termos o Universo como nossa casa, e não apenas este pedaço de Terra.

Entendermos de maneira dialética, sabedores desde futuro, ser o presente, tudo o que temos, o mais importante a ser vivido, experimentado. A felicidade não está fora de nós e eu um outro tempo. Com a dimensão poética das vidas itinerantes nos educaremos, onde, com quem e com o que temos hoje.
Em “Emílio ou da Educação”, Rousseau escreve: ‘Cada um perceberá que a própria felicidade realmente não está em si, mas depende de tudo aquilo que o circunda’. Mais tarde, a propósito da felicidade, Marx irá mais longe: ‘A experiência define como felicíssimo o homem que tornou feliz o maior número de outros homens... Se escolhemos na vida uma posição em que possamos melhor operar pela humanidade, nenhum peso nos pode envergar, porque os sacrifícios são para o benefício da humanidade; então, não provaremos uma alegria mesquinha, limitada, egoísta, mas a nossa felicidade pertencerá a milhões de pessoas, as nossas ações viverão silenciosamente, mas para sempre’. (DE MASI, 2014).

Em uma passagem de Fedro, na qual Platão descreve Sócrates que, já ancião e cansado, durante uma abafada tarde de verão se protege num lugar sombreado e aprecia toda a simples fruição que o local oferece: “Ah! Por Hera, que lugar magnífico para se fazer uma pausa! O plátano oferecendo uma sombra maravilhosa! Em plena floração, como está, o lugar não poderia ser mais perfumado. E o fascínio ímpar desta fonte que corre sob o plátano, a frescura da sua água: basta pôr o pé para me assegurar... E diga-me, por gentileza, se o ar puro por aqui se respira não é desejável e extraordinariamente agradável! Clara melodia do versão que faz eco ao coro das cigarras. Mas a mais saborosa dentre essas belezas é este prado, com a natural doçura da sua inclinação, a qual permite, quando nele se deita, que a cabeça fique numa posição perfeitamente confortável” (DE MASI, 2003).
Não concluo, pois é impossível concluir, apenas intuo ser urgente pensarmos associar à tese das vidas itinerantes, além da necessária exploração científica da razão e dos relacionamentos com novas descobertas da neurociência, das pesquisas sobre o cosmo, a educação com os aspectos da poética na construção do Homem espiritual e eterno.

BIBLIOGRAFIA

 DE MASI, Domenico. O futuro chegou – Modelos de vida para uma sociedade desorientada. [tradução Marcelo Costa Sievers]. 1ed. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2014.
 DE MASI, Domenico. Criatividade e grupos criativos. [tradução Léa Manzi e Yadyr Figueiredo]. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.


* Ciro Pirondi é Arquiteto e Urbanista. Graduado em Arquitetura e Urbanismo (1980), possui doutorado (1980/1982), pela Escola Técnica Superior de Arquitetura – Universidade Politécnica de Catalunya – Barcelona – Espanha. Diretor da Escola da Cidade – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (SP), desde 2002 até o momento. Conselheiro da Fundação Oscar Niemeyer, Casa de Lúcio Costa, Instituto de Arquitetos do Brasil e do IBAC (Instituto Brasileiro de Arte e Cultura). Escritório próprio desde 1983 (Ciro Pirondi Arquitetos Associados).

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

O Livre-Arbítrio no Espiritismo - por Eugenio Lara

O Livre-Arbítrio no Espiritismo

Eugenio Lara

A existência do livre-arbítrio tem importância fundamental para a Filosofia Espírita porque toda sua ética, sua axiologia ou teoria de valores é baseada na ideia de liberdade, de livre-escolha. A base, o esteio da Ética Espírita é a liberdade. E liberdade, aplicada à ação do sujeito, pressupõe, segundo a Filosofia Espírita, o livre-arbítrio, sem o qual “o homem seria uma máquina”.
A Filosofia Espírita admite que há um determinismo natural, engendrado pela “força das coisas”, pelas leis naturais. Todavia, esse determinismo não anula o livre-arbítrio. O espirito é livre e responsável pelos seus atos. E mais, diz que nos atos da vida moral, jamais há fatalidade. A fatalidade somente existe no momento em que reencarnamos e desencarnamos: no nascimento e na morte:
“Não existe de fatal, na verdadeira acepção do vocábulo, senão o instante da morte. Quando ele chega, deste ou daquele modo, não podeis a ele fugir”. (O Livro dos Espíritos q. 852).
“A fatalidade não consiste senão na hora em que deveis aparecer e desaparecer daqui debaixo”. (LE q. 859).
“A fatalidade está nos acontecimentos que se apresentam, pois estes são a consequência da escolha da existência feita pelo Espírito. Pode não ser o resultado desses acontecimentos, pois pode o homem lhes modificar o curso por uma ação prudente. Jamais ela está nos atos da vida moral.” (LE - Resumo teórico do móvel das ações humanas).
Segundo a Filosofia Espírita, o livre-arbítrio se caracteriza da seguinte maneira:
1. É um atributo natural do princípio inteligente, do espírito, que molda a capacidade de pensar e de agir, sem o qual ele seria uma máquina desprovida de liberdade. Ser senhor de si mesmo é um direito que vem da Natureza. A liberdade é, portanto, um direito natural do princípio inteligente.
2. É evolutivo porque se desenvolve na medida em que o princípio inteligente progride. De início o livre-arbítrio é bastante rudimentar, instintivo, para se tornar pleno e integrado ao espírito em seu estágio hominal, quando este supera os primeiros patamares do progresso intelecto-moral.
3. É relativo porque depende das relações sociais, interpessoais, da cultura. A liberdade absoluta somente existe, teoricamente, para o eremita no deserto.
4. Depende das vicissitudes materiais para se manifestar. Quanto menos materialidade, maior a sua expressão e manifestação.
5. Tem um sentido profundamente moral, ético porque através do livre-arbítrio o ser humano toma decisões comportamentais que irão influir nos relacionamentos interpessoais, sociais. É a responsabilidade moral e social.
6. É compatível com o determinismo natural, porque não há fatalidade nos atos da vida moral. É como imaginar as correntes do mar que não impedem o nado livre dos peixes. Do mesmo modo, as correntes da vida natural e social não impedem que o espírito aja com liberdade.
A Filosofia Espírita acompanha os avanços da ciência, os fatos comprovados e admite os fatores ambientais, culturais, genéticos e psicológicos que influem nas decisões humanas. E ainda acrescenta mais alguns dados complicadores:
a.   A influência dos espíritos. Muitas vezes “são eles que nos dirigem”. Os processos obsessivos influem decisivamente no livre-arbítrio.
b.   A voz do instinto, um dado novo na obra kardequiana, porque representa todo um conjunto de vivências e experiências advindas de outras existências e que, de modo intuitivo, podem servir como orientação em decisões cruciais na vida do espírito reencarnado.
c.    O livre-arbítrio permite ao espírito configurar o gênero de vida, determinando desta forma o gênero de morte. Tal escolha está subordinada à capacidade intelecto-moral e psíquica do espírito reencarnante.
d.   A volição existe sempre, mesmo nos estágios inferiores do desenvolvimento intelecto-moral. Já o livre-arbítrio, desenvolve-se na medida em que o espírito vivencia a erraticidade, com um certo nível de consciência de si mesmo e do meio em que vive.
A partir desses pressupostos, pode-se inferir que todos os seres da natureza têm volição. O espírito puro, conforme a escala espírita, também é volitivo, todavia, por estar plenamente integrado às leis naturais, não possui livre-arbítrio, dada a inutilidade desse atributo natural, em função de seu avançado estágio evolutivo.

NR: Este artigo foi originalmente publicado na edição de dezembro de 2015 do Jornal ABERTURA.

Eugenio Lara, arquiteto e designer gráfico E-mail: eugenlara@hotmail.com

Os artigos desta coluna baseiam-se em estudos e pesquisas desenvolvidos pelo CPDoc.  www.cpdocespirita.com.br  -  contato@cdocespirita.com.br

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Espiritismo em Sociedade - Reinaldo di Lucia

Espiritismo em sociedade

A crise que enfrentamos no Brasil – ética, econômica e política – tem minado a esperança do brasileiro em dias melhores. Ao conversarmos com as pessoas, notamos que, de maneira geral, já não se acredita mais no futuro. A frase “o Brasil não tem mais jeito” é muito comum, e tem sido mais e mais dita por gente de todas as idades e classes sociais.

O efeito mais evidente deste sentimento é a observação de que, a cada dia que passa, temos mais jovens mostrando um grande desejo de deixar o país. Quando perguntados o porquê disso, esse grupo aponta a falta de perspectiva de trabalho, a descrença absoluta na classe política e em sua capacidade (e vontade) de mudar a situação e, principalmente, a certeza de que o brasileiro é assim mesmo e a situação não vai mudar jamais.

Como nós, como povo, deixamos a coisa chegar neste ponto? Há inúmeras explicações históricas que demonstram o impacto que a colonização portuguesa, a cultura autoritária e, mais recentemente, a ditadura militar tiveram para este resultado – todas, a meu ver, absolutamente corretas, mas de pouca ação prática. O problema é que, com a situação posta do jeito que está, o que teremos em breve é um país no qual o aprofundamento das desigualdades sociais tornará o Brasil mais parecido com o Haiti que com a Noruega.

Precisamos pensar em soluções diretas e urgentes. Mas o que vemos, institucionalmente, é uma paralisação global: a classe política não tem interesse em modificar este estado de coisas, a justiça se perde em tecnicalidades, a escola foca o currículo sem se preocupar com sua aplicação e as instituições religiosas, possivelmente as mais conservadoras, prometem, no máximo, a abundância material e a salvação eterna, desde que o fiel seja submisso aos seus desígnios.

E nós, espíritas, o que estamos fazendo? Como doutrina humanista e  livre-pensadora, temos a obrigação de contribuir para que as pessoas tenham mais acesso a discussões que levem a uma ação efetiva na construção de um futuro melhor. Se ficarmos na dependência do poder público, nada acontecerá, ao menos no médio prazo. Penso que é necessário que nossa visão de mundo, profundamente libertadora, seja cada vez mais difundida, porém com um viés prático. Precisamos deixar de lado as discussões inócuas e superficiais, bem como as acusações “alimentares” (coxinhas x mortadelas) e mostrar causas e consequências do que aí existe, debatendo o modelo de sociedade e de país que queremos e como podemos chegar a ele.

Não, não podemos mais esperar que seja feita uma reforma política, uma reforma do ensino ou o que quer que seja. Precisamos agir diretamente, com os recursos – ainda que parcos – que temos. Não faz sentido, numa situação cada vez mais crítica, dissociarmos a teoria espirita da discussão social, prática; especular sobre o mundo dos espíritos e deixar para depois nossa realidade física. É vital travarmos este debate nas casas espíritas, de forma respeitosa quanto às diferenças e tendo em mente que o objetivo é o mesmo: uma sociedade mais igualitária, mais justa e mais nobre.

NR: Originalmente publicado no Jornal Abertura em outubro de 2016

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Amai os vossos inimigos - por Alexandre Cardia Machado

Amai os vossos inimigos:

Amai os vossos inimigos; fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos perseguem e caluniam, a fim de serdes filhos do vosso Pai que está nos céus e que faz se levante o Sol para os bons e para os maus e que chova sobre os justos e os injustos. – Porque, se só amardes os que vos amam, qual será a vossa recompensa?”

Esta frase de Jesus é sempre um desafio a todos nós, mas interpretando com Allan Kardec, como buscamos fazer abaixo , nos parece mais fácil de concordar  – “2. “Se somente amardes os que vos amam, que mérito se vos reconhecerá, uma vez que as pessoas de má vida também amam os que as amam?

– Se o bem somente o fizerdes aos que vo-lo fazem, que mérito se vos reconhecerá, dado que o mesmo faz a gente de má vida? – Se só emprestardes àqueles de quem possais esperar o mesmo favor, que mérito se vos reconhecerá, quando as pessoas de má vida se entreajudam dessa maneira, para auferir a mesma vantagem? Pelo que vos toca, amai os vossos inimigos, fazei bem a todos e auxiliai sem esperar coisa alguma.”  - Evangelho Segundo o Espiritismo.

Neste momento em que vivemos é necessário apelar ao bom senso e baixar o nível de ódio, que nos cerca, passamos pelo momento em que uma Presidente da República  está em processo de Impeachment e o Presidente da Câmara dos Deputados está com seu mandato suspenso onde, uma sensação de revanche, toma conta de grande parte da sociedade. Este sentimento de revanche não pode ser, de maneira alguma, o sentimento que nos move, em momento tão grave. Temos que ser motivados pela concordância que o Poder Judiciário defende o direito da cidadania.

O momento é de encontrar meios de união, capaz de permitir que o país volte a crescer, aumentando as oportunidades de trabalho para a população.

As disputas políticas são a normalidade em uma democracia, perder ou ganhar é parte do processo, se respeitarmos a Constituição, toda a disputa política é valida. O que queremos dizer é, não importa o lado que cada um de nós está, em alguns meses haverão novas  eleições e em dois anos e pouco, uma nova eleição para Presidente da República acontecerá. Ou seja é hora de trabalhar para construir uma nova fase positiva que beneficiará a todos os brasileiros.

A sequência do texto do Evangelho leva à considerarmos as reencanrnações, como um instrumento de ajuda no processo de reduzir o ódio, mas não precisamos esperar tanto, temos que com maturidade, enfrentar o que está  muito claro, houve aparelhamento da máquina pública, com o objetivo de financiar um projeto político, feito de forma ilegal, conforme amplamente divulgado pelas Delações Premiadas. Este grave problema foi identificado e está sendo desmantelado, o erro não está nesta ou naquela ideologia, mas sim na prática do ilícito. Ora, passado este momento, as diversas correntes que busquem novas lideranças internas, pois só a pluralidade é que permitirá o progresso reto da nação brasileira.

Há que se continuar investigando em todas as operações da Polícia Federal, pois não há como conviver com a corrupção. Esta maturidade que nosso país começa a atingir, quer no campo do Judiciário, quer no campo da Polícia Federal – à partir de um novo marco obtido pela união da Receita Federal com a Polícia Federal e do episódio do Mensalão, nos faz atingir um potencial investigativo jamais possível. Para encontrar o corrupto, basta seguir as movimentações financeiras, desde que todo o processo esteja revestido de um mandato judicial.

Esta interpretação, sabemos, não é unanime, alguns acham que a justiça está ultrapassando os direitos individuais, não somos tão avançados no conhecimento jurídico, mas a experiência comum é que a jutiça sempre é feita considerando os dois lados o da acusação e da defesa, portanto este é o processo e o contraditório é o normal. Errar, ser punido, aprender com o erro e melhorar, está na basa de nossa Doutrina Espírita, faz parte da sabedoria Divina e portanto é um processo natural. Aqueles que erraram precisam necessariamente mudar seus métodos, rencontrar-se. Ficar com o pensamento fechado em teorias de conspiração em nada ajuda. Há que se olhar para dentro e renovar-se.

Que no próximo número possamos estar escrevendo sobre coisas mais amenas e que diversifiquemos o nosso pensamento, bastante concentrado nestes problemas que expõe  diariamente a fragilidade moral humana.